Lembro de quando incluí a Ilha do Sol na minha viagem pela América do Sul. Estava lendo um guia de viagens e fiquei fascinada com o lugar. Metade lenda, metade fatos concretos, acredita-se que a origem da civilização inca tenha se dado ali, quando Manco Capac e Mama Oclo, que eram irmãos e também um casal, emergiram das águas do Titicaca.
Alguns meses depois, com o roteiro definido e o pé na estrada, parti de La Paz rumo à Copacabana, cidade base para quem vai à Ilha do Sol. O que eu não esperava era alcançar esse destino após um misto de gripe e intoxicação alimentar que haviam me derrubado. E foi assim, sem um pingo de pique, que eu cheguei na pousada La Cupula.
Minha sorte é que, além de muito charmosa, a hospedagem tinha um jardim com redes e uma vista panorâmica revigorante. Passei metade do dia ali, recarregando as forças. Assim que me senti melhor, levantei e resolvi explorar o local.
Desci até a margem do Lago e caminhei no fim de tarde pela “praia” de Copacabana. Conheci ainda a bela Catedral da cidade , colorida pelos seus azulejos portugueses, e só pulei o passeio ao mirante do Cerro Calvário, para poupar energias para o dia seguinte. Quem quiser ampliar o roteiro, ainda pode ir ao observatório astronômico Horca del Inca.
Copacabana – Isla del Sol
No dia seguinte, às 08h30, fui para a orla e peguei um dos vários barcos que fazem o trajeto rumo ao povoado de Yumani. Lá está a maior concentração de hotéis e restaurantes da Ilha do Sol.
Aqui, cabe uma dica fundamental: Fique ao menos 1 noite na Ilha do Sol. Sendo assim, leve uma mochila com uma muda de roupa, deixando o restante da mala no hotel de Copacabana. Isso porque a escada de pedras incas que você terá que encarar para acessar o vilarejo de Yumani, somada à altitude de 4 mil metros, torna a empreitada muito desgastante.
Chegando ao hotel, o Palla Khasa, recuperei o pouco fôlego que me restou tomando um chá de coca e lá pela 1 da tarde tive que fazer uma escolha crucial: iniciar a trilha de 5 horas (ida e volta) mesmo muito cansada ou me contentar com as paisagens que tinha visto até o momento. Isso porque faria o caminho até o norte da ilha sozinha e deveria voltar antes de anoitecer, é claro.
A trilha rumo ao norte: Yumani – Cha’llapampa.
Para não morrer de arrependimento, pois havia separado apenas uma noite por lá, resolvi tomar a atitude nem tão prudente de fazer a trilha sem margem para atrasos ou imprevistos. Vesti camiseta dry fit, casaco tipo sleece, uma jaqueta corta vento, calça segunda pele, calça esportiva e ainda levei cachecol, luva e gorro, pois apesar do dia lindo e ensolarado faz muito frio por causa dos fortes ventos e da altitude elevada.
Seguindo rumo a Cha’llapampa, encontrei boa parte das pessoas já voltando da caminhada. Se por um lado fiquei com medo de anoitecer e ficar perdida na trilha, por outro lado fiquei totalmente anestesiada pelo visual estonteante do lugar com uma vegetação amarela e verde contrastando com o azul profundo do lago, os moradores nativos interagindo com os animais e o melhor: o silêncio absoluto. Silêncio que uma paulistana como eu está tão pouco habituada a presenciar.
Nunca meditei na vida, mas acho que encontrei meu ponto de equilíbrio fazendo essa trilha. Em meio ao cansaço físico extremo, minha mente despertou para uma quantidade de reflexões que acredito não serem possíveis nem em uma década de terapia.
Mas o sol já estava mais baixo quando cheguei ao destino final de Cha’llapampa, no norte da ilha, e pude ver as ruínas de Chincana, a mesa cerimonial de sacrifícios e a Pedra do Puma. Devo ter passado não mais do que 20 minutos ali, percorrendo os labirintos do que foi no passado um palácio inca.
Preocupada com o horário, era hora de voltar e apressar o passo. Com mais descidas do que subida, fiz este trecho tranquilamente em 1 hora e meia, contra 3h30 da ida (!). Algumas das melhores visões que tive foram nesse momento, com o sol baixinho, quase mergulhando no lago. Voltei ao hotel a tempo de reverenciar os últimos 10 minutos de luz solar em uma cadeira confortável.
A temperatura caía consideravelmente e era hora de tomar uma sopa de quinua quentinha acompanhada por um chá de muña, erva típica local. Com a alma aquecida, fui dormir orgulhosa, desfrutando da felicidade que só é possível para quem arrisca e supera seus pequenos ou grandes desafios.
Dicas:
Copacabana
Onde fiquei: A vantagem de viajar à Bolívia é que mesmo com pouca grana você pode cacifar lugares realmente legais. Por 80 bolivianos fiquei num quarto single, mas com banheiro compartilhado no La Cupula. Para quartos com banheiro privativo, uma boa escolha pode ser o vizinho Las Olas. Ambos são muito procurados e precisam ser reservados com antecedência.
Onde comi: Fui ao restaurante do La Cúpula e achei uma delícia. Por lá, gasta-se uma media de b/40. Próximo a orla, há uma série de restaurantes mais movimentados, que ficam abertos até bem tarde. Nessa linha, vá provar a pizza ou os sanduíches do Pueblo El Viejo.
Ilha do Sol
Onde fiquei e comi: Hotel Palla Khasa. Fica mais afastado dos demais, mas está bem acima da média para os padrões da ilha. Paguei b/140 no quarto single com banheiro privativo. Existem hospedagens simples a partir de s/25, mas a vista incrível e o ótimo restaurante do Palla Khasa valeram o investimento.
UPDATE: Escreveram para o lachicademochila@gmail.com perguntando sobre as taxas de entrada na ilha. Achei importante complementar essa informação. Paguei 5 bolivianos para adentrar na parte sul (Yumani) e 15 na parte norte (Challa).